domingo, fevereiro 17, 2013

A Maldição do Tigre - Capítulo 3 - parte II

   - Ah, você o ofendeu. Ele é muito sensível, sabia? Respondendo à sua pergunta, ele é macho.
   - Humm.
   Depois que o tigre comeu, o Sr. Davis sugeriu que eu observasse o animal praticar seu número. Fechamos as portas do galpão e deslizamos as traves de madeira para trancá-las e impedir que o tigre escapasse. Então subi a escada de mão até o mezanino para assistir de cima. Se alguma coisa desse errado, o Sr. Davis me instruíra a sair pela janela e chamar o Sr.Maurizio.
   O pai de Matt se aproximou da jaula, abriu a porta e chamou Justin. O tigre olhou para ele e então pôs a cabeça de volta sobre as patas, sonolento. O Sr. Davis tornou a chamá-lo.
   - Venha!
   A boca do tigre se abriu em bocejo e suas mandíbulas se escancararam. Estremeci ao ver os dentes imensos. Ele se levantou e esticou as patas dianteiras e em seguida as traseiras, uma de cada vez. Ri ao comparar mentalmente esse grande predador com um gatinho dorminhoco. O tigre deu meia-volta e desceu pela rampa, saindo da jaula.
   Depois de ajeitar um banqueta, o Sr. Davis estalou o chicote, instruindo Justin a saltar. Então pegou a argola e fez o tigre pular por ela durante vários minutos. O animal saltava de um lado para outro, passando com facilidade pelas várias atividades. Seus movimentos não demonstravam o menor esforço. Eu podia ver seus músculos vigorosos movendo-se sob o pelo listrado preto e branco enquanto praticava o seu número.
   O Sr. Davis parecia um bom domador, as por uma ou duas vezes percebi que o tigre podia ter levado a melhor sobre ele. Num dado momento, o rosto do Sr. Davis ficou muito perto das garras estendidas do tigre e teria sido muito fácil para o animal atingi-lo, mas, em vez disso, ele tirou a pata do caminho. Em outra ocasião, eu podia jurar que o Sr. Davis havia pisado em sua cauda, no entanto, o tigre apenas grunhiu suavemente e deslizou a cauda para o lado. Aquilo era muito estranho e eu me vi ainda mais fascinada pelo belo animal, imaginado como seria tocá-lo.
   O galpão estava abafado e o Sr. Davis transpirava visivelmente. Ele incitou o tigre a voltar para a banqueta e então dispôs mais três banquetas perto da primeira e o fez saltar de uma para outra. Ao terminar, levou o felino de volta para a jaula, deu-lhe um petisco especial e fez sinal para que eu descesse.
   - Kelsey, é melhor você ir para o edifício principal e ajudar Matt a se preparam para o espetáculo. Hoje teremos um grupo da terceira idade vindo de um centro comunitário.
   Desci a escada.
   - Tudo bem se eu trouxer meu diário até aqui para escrever de vez em quando? Quero desenhar o tigre.
   - Tudo bem - disse ele. - Só não chegue muito perto.
   Saí correndo do galpão, acenei para ele e gritei:
   - Obrigada por me deixar assistir ao ensaio. Foi muito emocionante!
   Cheguei correndo para ajudar Matt no momento em que o primeiro ônibus parava no estacionamento. Foi exatamente o oposto do dia anterior. Primeiro, a mulher responsável pelo grupo comprou todos os ingressos de uma vez só, o que tornou meu trabalho muito mais fácil, e então todos os espectadores se dirigiam devagar para dentro, acomodaram-se em seus lugares e logo caíram no sono.
   Como eles podem dormir em meio meio a todo esse barulho? No intervalo, não havia muito a fazer. Metade dos espectadores ainda estava dormindo, e a outra metade aguardava na fila no banheiro. Na verdade, ninguém comprou nada.
   Depois do espetáculo, Matt e eu limpamos tudo num piscar de olhos, o que me deu algumas horas de folga. Corri de volta para a cama, peguei meu diário, uma caneta, um lápis e minha colcha e me dirigi ao galpão. Abri a pesada porta e acendi as luzes.
   Fui andando até a jaula do tigre e o encontrei descansando com a cabeça apoiada nas patas. Dois fardos de feno formavam uma boa cadeira com espaldar. Abri a colcha sobre o colo e peguei o diário. Depois de escrever alguns parágrafos, comecei a desenhar.
   Tivera aulas de arte no ensino médio e meus desenhos com modelo eram bastante razoáveis. Peguei o lápis e olhei para o tigre. Ele me encarava - mas não como se quisesse me devorar. Era mais como... como se estivesse tentando me dizer alguma coisa.
   - Oi. Está olhando o quê? - perguntei, sorrindo.
   Voltei ao desenho. Os olhos redondos do tigre eram bem separados e de um castanho intenso. Ele tinha cílios longos e negros, e um focinho rosado. Seu pelo era de um branco leitoso, com riscas negras propagando-se a partir da testa e da face até a cauda. As orelhas curtas e peludas estavam inclinadas na minha direção e sua cabeça descansava preguiçosamente nas patas. Enquanto me observava, sua cauda se agitava de um lado para outro.
   Fiquei muito tempo tentando acerta o padrão das listras, pois o Sr. Davis me contara que não havia dois tigres com o mesmo padrão. Disse que as listras eram tão distintivas quanto as impressões digitais humanas.
   Continuei a falar com ele enquanto desenhava.
   - Como é mesmo seu nome? Ah, Justin. Bem, vou chamá-lo apenas de Jus. Espero que não se importe. Então, tudo bem com você? Gostou do café da manhã? Sabe, para uma coisa que poderia me comer, você tem um rosto muito bonito.
   Depois de um silencioso intervalo no qual os únicos sons que se ouviam era o do lápis arranhando o papel e o da respiração profunda e ritmada do grande animal, perguntei:
   - Você gosta de ser um tigre de circo? Não deve ser muito emocionante ficar preso nessa jaula o tempo todo.
   Fiquei em silêncio por algum tempo e mordi o lábio enquanto escurecia as listras de seu rosto.
   - Gosta de poesia? Vou trazer meu livro de poemas e ler para você um dia. Acho que tem um sobre gatos que você vai adorar.
   Ergui os olhos do desenho e fiquei surpresa ao ver que o tigre havia se mexido. Ele estava sentado, a cabeça abaixada na minha direção, e me olhava fixamente. Comecei a me sentir um pouco nervosa. Um grande felino fitando você de forma intensa não pode ser um bom sinal.
   Nesse exato momento, o pai de Matt entrou no galpão. O tigre deixou-se cair de lado, mas manteve o rosto voltado para mim, observando-me com aqueles olhos castanhos intensos.
   - Oi, menina. Como vai?
   - Tudo certo. Ah, tenho uma pergunta. Ele não se sente ? Vocês já tentaram encontrar uma namorada para ele?
   Ele riu.
   - Não para este aí. Ele gosta de ficar sozinho. No outro circo me contaram que tentaram cruzá-lo com uma fêmea branca do zoológico que estava no cio, mas ele não quis nada com ela. Até parou de comer e acabaram tirando-o de lá. Acho que ele prefere o celibato.
   - Bem, é melhor eu sair para ajudar o Matt nos preparativos do jantar.
   Fechei o diário e apanhei minhas coisas. Enquanto eu me dirigia ao edifício principal, meus pensamentos se voltaram para o tigre. Pobrezinho. Completamente só, sem uma tigresa ou filhotinhos. Impedido de caçar, preso aqui no cativeiro. Fiquei triste por ele.
   Depois do jantar, ajudei o pai de Matt a levar os cães para outro passeio e em seguida me preparei para dormi. Pus as mãos sob a cabeça e fiquei olhando para o teto da tenda, pensando um pouco mais tigre. Depois de me revirar de um lado para outro por 20 minutos, decidi ir até o galpão de novo. Mantive todas as luzes apagadas, exceto a que ficava perto da jaula, e segui para meu fardo de feno com a colcha.
   Eu me sentia sentimental e por isso levara comigo um exemplar de Romeu e Julieta.
   - Oi, Jus. Quer que eu leia um pouco para você? Bem, não existem tigres na história de Romeu e Julieta, mas quando Romeu subir em uma sacada, você pode se imaginar subindo em uma árvore, está bem? Espere um segundo. Vou criar a atmosfera adequada.
   Era noite de lua cheia, então apaguei a luz, já que o luar entrando pelas janelas iluminava o suficiente do galpão para que eu pudesse ler.
   A cauda do tigre batia na base de madeira do vagão. Virei-me de lado, improvisei um travesseiro com o feno e comecei a ler em voz alta. Eu só conseguia distinguir-lhe o perfil e ver seus olhos brilhando na luz espectral. Comecei a me sentir cansada e suspirei.
   - Ah, não se fazem mais homens como Romeu. Talvez um homem assim nunca tenha existido. Exceto pela minha presente companhia, é claro. Tenho certeza de que você é um tigre muito romântico. Shakespeare sabia mesmo escrever sobre homens sonhadores, não é?
   Fechei os olhos para descansar um pouco só acordei na manhã seguinte.


Daquele dia em diante, eu passava todo o meu tempo livre no galpão com Jus. Ele parecia gostar da minha presença e sempre empinava as orelhas quando eu começava a ler para ele. Importunei o pai de Matt com perguntas e mais perguntas sobre tigres até sentir que ele já estava me evitando. Mas sabia que o Sr. Davis gostava do meu trabalho.
   Todo dia eu me levantava cedo para cuidar do tigre e dos cães, e todas as tardes eu me sentava perto da jaula de Jus para escrever em meu diário. À noite, levava minha colcha e um livro. Às vezes escolhia um poema e o lia e voz alta. Outras vezes, eu apenas conversava com ele.

Cerca de uma semana depois de eu começar a trabalhar no circo, Matt e eu estávamos assistindo ao espetáculo, como de costume, mas quando chegou a hora do número do Jus, ele pareceu diferente. Depois de percorrer o túnel e entrar na jaula, correu em círculos e andou de um lado para o outro diversas vezes. Ficava olhando para a plateia, como se estivesse procurando alguma coisa.
   Por fim, imobilizou-se como uma estátua e olhou diretamente para mim. Ouvi o chicote estalar várias vezes, mas o tigre mantinha o olhar fixo em mim. Matt me cutucou e o contato visual se desfez.
   - Que coisa mais estranha - disse Matt.
   - Qual é o problema? - perguntei. - O que está acontecendo? Por que ele está olhando para nós?
   Ele deu de ombros.
   - Não sei. Isso nunca aconteceu.
   Jus finalmente parou de nos olhar e deu início à sua rotina. Depois de terminado o espetáculo e de eu acabar a limpeza, fui visitar Jus, que andava de um lado para outro na jaula. Quando me viu, ele se sentou, acomodou-se e pousou a cabeça sobre as patas. Fui até a jaula.
   - Oi, Jus, O que está havendo com você hoje? Estou preocupada. Espero que não esteja ficando doente nem nada.
   Ele ficou descansando em silêncio, mas manteve os olhos em mim, seguindo meus movimentos. Aproximei-me lentamente da jaula. Eu me sentia atraída pelo animal e não conseguia controlar uma compulsão muito forte e perigosa. Era um impulso quase tangível. Talvez porque eu sentisse que éramos ambos solitários ou talvez porque ele fosse uma criatura tão linda. Não sei o motivo, mas eu queria - eu precisava - tocá-lo.
   Tinha noção do risco, mas não sentia medo. De alguma forma, eu sabia que ele não me machucaria, então ignorei os sinais de alerta que piscavam em minha mente. Meu coração começou a bater muito rápido. Dei mais um passo em direção à jaula e fiquei ali parada por um instante, trêmula. Jus estava totalmente imóvel. Continuava a me olhar, calmo, com seus olhos castanhos.
   Estendi lentamente a mão na direção da jaula, esticando os dedos até sua pata. Toquei seu pelo branco e macio com a ponta dos dedos. Ele solto um profundo suspiro, mas não se mexeu. Ganhando coragem, pus toda a mão sobre sua pata, acariciei-a e percorri uma das listras com o dedo. Sem o menos aviso, sua cabeça se moveu na direção da minha mão. Antes que eu pudesse tirá-la da jaula, ele a lambeu. Senti cócegas.
   Retirei a mão rapidamente.
   - Jus! Você me assustou! Pensei que fosse arrancar meus dedos!
   Hesitante, estendi a mão, aproximando-a da jaula novamente, e sua língua rosada atravessou as grades para lambê-las. Deixei- o lamber algumas vezes e então fui até a pia e lavei a saliva de tigre.
   Voltando ao meu cantinho favorito, no fardo de feno, eu disse:
   - Obrigada por não me comer.
   Ele bufou levemente em respostas.
   - O que você gostaria de ler hoje? Que tal aquele poema de gato que lhe prometi?
   Eu me sentei, abri o livro de poemas e encontrei  a página.
   - Muito bem, aqui vai.

EU SOU O GATO
Leila Usher

No Egito, me veneravam.
Eu sou o Gato.
Porque não me dobro à vontade do homem,
Chamam-me mistério.
Quando pego e brinco com um rato,
Chamam-me cruel,
No entanto, eles capturam animais
Em parques e zoos, para que possam admirá-los.
Acham que todos os animais foram feitos para o seu prazer,
Para serem seus escravos.
E, enquanto eu mato apenas quando preciso,
Eles matam por prazer, poder e ouro,
E se consideravam superiores!
Por que eu deveria amá-los?
Eu, o Gato, cujos ancestrais
Orgulhosamente percorreram a selva,
Nenhum deles domado pelo homem.
Ah, por acaso eles sabem
Que a mesma mão imortal
Que lhes soprou a vida também soprou a minha?
Mas somente eu sou livre
Eu sou O GATO.

   Fechei o livro e olhei, pensativa, para o tigre. Eu o imaginei altivo e nobre, correndo pela selva em uma caçada. De repente tive muita, muita pena dele. Essa vida de se apresentar em um circo não é digna, mesmo que você tenha um bom domador. Um tigre não é um cachorro ou um gato, que podem ser animais de estimação. Ele deveria estar em liberdade, na natureza.
   Levantei-me caminhei até o tigre. Titubeante, estendi a mão para a jaula a fim de acariciar sua pata outra vez. Imediatamente, sua língua veio lamber a minha mão. A princípio eu ri, depois fiquei séria. Devagar, levei a mão até sua face e alisei o pelo macio. Então, ganhando coragem, cocei atrás de sua orelha. Uma vibração profunda ressoou em sua garganta e eu me dei conta de que ele estava ronronando. Sorri e cocei um pouco mais sua orelha.
   - Gosta disso, não é?
   Tirei a mão da jaula, sempre lentamente, e fiquei observando-o por um minuto, refletindo sobre o que havia acontecido. Ele tinha uma expressão de melancolia quase humana. Se os tigres têm alma, e acredito que tenham, imagino que a dele seja triste e solitária.
   Olhei dentro daqueles grandes olhos castanho e sussurrei: 
   - Queia que você fosse livre.




WHATZZUP? 
Então não demorei dessa vez, eu pensei em vocês leitoras... 
Eu fiquei PUTA da vida com o jogo do Galo X Ganso.
Eu tava torcendo pro meu Ganso, apesar de ser atleticana.
E respondendo a Jossy, sim eu me inspirei no livro a maldição do tigre, é uma pena que não você leu, é ótimo!!
Então, estou indo, até sexta amores :* 

2 comentários:

  1. Posta logo vai, to adorando
    Vou ver se acho o livro, lendo essa Ib, fiquei com vontade de ler esse livro!
    bjos

    ResponderExcluir
  2. meu deus! THIS IS PERFECT <3

    ResponderExcluir